Os Estados Unidos alertaram seus cidadãos que pretendem visitar o Brasil no Carnaval sobre os riscos que correm ao se aventurar pelas ruas do país tropical. Recomendam que aqueles que vierem desfrutar das cálidas praias nordestinas, sob o sol causticante, ou acompanhar o desfile na Marquês de Sapucaí, onde serelepes dançarinas evoluem embaladas por sambas de letras ufanistas, evitem portar grandes quantias em dinheiro. Também sugerem que se abstenham de adentrar favelas ou circular de carro com as janelas abertas.
As autoridades municipais por todo o Brasil, por sua vez, alertam seus concidadãos quanto ao perigo vindo dos céus. Em dias chuvosos, recomendam que motoristas, ciclistas e pedestres aguardem pacientemente o escoamento das águas, permitindo que elas cumpram seu papel de desordem e destruição, como se fossem um fenômeno inescapável e não um reflexo da incompetência estatal.
Mas de quem é a culpa pela ausência de drenagem urbana eficiente? Quem deve zelar pela segurança dos cidadãos, esses mesmos que sustentam o aparato público por meio de impostos escorchantes? Quem responde pelo aumento do preço do café ou pela inflação que corrói os salários? O polêmico jornalista Paulo Francis, ateu por convicção e crítico mordaz, dizia que o imposto no Brasil é uma doação, pois não há retorno.
Tenho escrito com frequência sobre gestão, estabelecendo um liame com a psicologia, tema pelo qual também nutro grande predileção. Aliás, são ciências convergentes e intimamente relacionadas, especialmente no que tange à administração de recursos humanos.
Recentemente, em uma entrevista, o psiquiatra forense Guido Palomba mencionou o termo “garra dos inocentes”, referindo-se à tenacidade de um acusado injustamente ao se defender da imputação de um crime. Já um criminoso, consciente de sua culpa, por motivos óbvios, muitas vezes é desprovido dessa característica, e entrega-se a uma espécie de resignação apática diante do veredicto iminente.
O fato é que, quando um gestor público sugere que não levemos dinheiro para que não sejamos roubados, que esperemos dentro do carro a chuva passar para que a enxurrada não nos carregue, que fiquemos presos em nossas casas para não sermos assaltados ou que simplesmente deixemos de comprar um produto qualquer para não alimentar a inflação, ele não apenas se isenta da responsabilidade como também nos impõe uma sentença por um crime que não cometemos.
São em momentos como esses que o contribuinte se assemelha a um moribundo sem a “garra dos inocentes”, e fica entregue a uma "abulia de defesa", estado típico dos culpados. Agindo assim, complacente, o brasileiro exaurido por um sistema que lhe exige tudo e nada devolve, não reage, não brada, não exige. Resignado, muitas vezes, aceita o veredicto e segue, condenado a pagar sem jamais questionar.